Os dados oficiais brasileiros mostram essa triste realidade de que somente 1% das cidades do país tem alguma ação com compostagem. Ou seja, estamos falando apenas de 56 cidades (arredondando para cima), num total de 5.570 municípios. É pouco. Muito pouco. É triste. Ridículo. Preocupante. Vamos relembrar algumas informações importantes que contamos para vocês nas publicações anteriores:
- O Brasil gera 220 mil toneladas de resíduos sólidos urbanos por dia;
- Pelo menos metade deste montante é resíduo orgânico, ou seja, 110 mil toneladas;
- Além de ser o resíduo mais abundante, sua destinação correta através da compostagem é fácil, de relativo baixo custo e traz inúmeros benefícios ambientais;
- Além disso tudo, o resíduo orgânico é o único que pode ser reciclado em nossas casas, através de diferentes técnicas de compostagem caseira.
Reciclar os resíduos orgânicos é uma técnica milenar. É simplesmente observar e acompanhar um ciclo natural onde o alimento é produzido na terra, colhido e utilzado na nossa alimentação, o que gera resíduos orgânicos, que são encaminhados para processos de compostagem, através dos quais ele vira adubo, que irá fertilizar a terra para a produção de novos alimentos e, assim, sucessivamente. Não parece óbvio? Pois é... mas para 99% das cidades não é. Incrível, né?
Isso significa dizer que quase todo o resíduo orgânico gerado no país está sendo destinado diretamente na terra, seja em lixões, aterros controlados ou aterros sanitários (já falamos sobre estes em publicações anteriores), sem nenhum tipo de aproveitamento. E isso traz diversos impactos socioambientais e econômicos.
O manejo adequado dos resíduos é uma importante estratégia de preservação do meio ambiente, assim como de promoção e proteção da saúde. Uma vez destinados de forma inadequada, os resíduos sólidos podem comprometer a qualidade do solo, da água e do ar, por serem fontes de compostos orgânicos voláteis, pesticidas, solventes e metais pesados, entre outros.
A decomposição da matéria orgânica presente no lixo resulta na formação de um líquido de cor escura, o chorume, que pode contaminar o solo e as águas superficiais ou subterrâneas pela contaminação do lençol freático. Pode ocorrer também a formação de gases tóxicos, asfixiantes e explosivos que se acumulam no subsolo ou são lançados na atmosfera.
Os locais de armazenamento e de disposição final tornam-se ambientes propícios para a proliferação de vetores e de outros agentes transmissores de doenças. De modo geral, os impactos dessa degradação estendem-se para além das áreas de disposição final dos resíduos, afetando toda a população.
Além desses impactos mais imediatos no ambiente, a disposição de resíduos sólidos pode contribuir de maneira significativa com o processo de mudanças climáticas. A decomposição anaeróbica da matéria orgânica presente nos resíduos gera grandes quantidades de gases de efeito estufa, principalmente o metano (CH4), segundo gás em importância dentre os considerados responsáveis pelo aquecimento global.
A destinação inadequada oferece também riscos importantes à saúde humana. Sua disposição no solo, em lixões ou aterros, por exemplo, constitui uma importante fonte de exposição humana a várias substâncias tóxicas. As principais rotas de exposição a esses contaminantes são a dispersão do solo e do ar contaminado, a lixiviação e a percolagem do chorume. O último pode ocorrer não apenas enquanto o lixão ou o aterro está em funcionamento, mas também depois de sua desativação, uma vez que os produtos orgânicos continuam a degradar.
Estudos têm indicado que áreas próximas a aterros apresentam níveis elevados de compostos orgânicos e metais pesados, e que populações residentes nas proximidades desses locais apresentam níveis elevados desses compostos no sangue. Assim, esses depósitos de resíduos sólidos constituem em potenciais fontes de exposição para populações, tendo sido relatado riscos aumentados para diversos tipos de câncer, anomalias congênitas, baixo peso ao nascer, abortos e mortes neonatais nessas e em populações vizinhas a esses locais.
Há ainda os riscos à saúde para os profissionais mais diretamente envolvidos no manejo dos resíduos, como é o caso do pessoal operacional do setor, o qual, em sua maioria, não conta com medidas mínimas de prevenção e segurança ocupacional.
A situação se torna mais crítica para indivíduos que trabalham e vivem da recuperação de materiais do lixo, especialmente os catadores de materiais recicláveis, os quais realizam seu trabalho em condições muito insalubres, geralmente sem equipamentos de proteção, resultando em alta probabilidade de adquirir doenças.
TEXTO: Julio Ruffin Pinhel